Carmen da Silva, uma rio-grandina precursora do feminismo brasileiro.

Depoimento do jornalista Jayme Copstein

(a partir de correspondência por e-mail com Nubia Hanciau)

Tanto quanto me lembro, ela [Carmen da Silva] trabalhava como secretária na Swift. Eu a conheci frequentando com as sobrinhas a casa do meu pai, ali na Marechal Floriano, quando vinha comprar chocolates com as gurias.

Muitos anos depois, já quando eu estava no Correio do Povo, conversamos uma vez (anos 70) a respeito daquele tempo, e ela até se referiu às empadinhas saborosas que comia na "Fruteira Nacional" do velho Bernardo Copstein.

Eu tinha 15 anos quando conversamos pela primeira vez. Hoje, à distância, é que tenho medida da densa solidão de uma pessoa extraordinariamente inteligente, estrangulada pela pequenez daqueles anos. Foi talvez a única pessoa verdadeiramente incompreendida que conheci pessoalmente em toda a minha vida.  Ela não tinha com quem conversar, por isso falava comigo. Não tenho mais como reproduzir o que era dito, mas com toda a certeza havia indicação de livros interessantes que podiam ser lidos na nossa Biblioteca.

Imagina tu uma mulher que enxergasse bem além do horizonte, em 1940, sob  a lupa e a maledicência dos 40 mil habitantes de uma pequena cidade. O que pensava, o que bebia, o que dizia, tudo era escândalo.

Ela morava com a irmã e o cunhado, o historiador Abeillard Barreto, em um casarão na esquina da Marechal Floriano com a Pinto Lima, na quadra fronteira à do Caixeiral.

O Abeillard era gerente do Banco do Brasil. Quando terminou a II Guerra Mundial, foi incumbido de implantar as filiais do BB, primeiro em Montevidéu, depois em Buenos Aires, onde a Carminha teve contato com a psicanálise e encetou a sua admirável carreira.

Acrescento um dado que me parece útil para te fazer sentir a catinga da intolerância daqueles tempos. A irmã da Carminha, esposa do Abeillard, cujo nome não me lembro, foi a primeira mulher a se tornar funcionária do Banco do Brasil em Rio Grande. Até então, era privilégio de homem. No início dos anos 30, houve uma abertura (fechada em seguida, e de novo por muito tempo), e ela ingressou na carreira. Conheceu o Abeillard, casou com ele e  deixou o trabalho, suponho que por não ficar bem a uma mulher de família.

Enfim, tens um belo garimpo a explorar. Te dou parabéns pela ideia.

Fico disponível para qualquer coisa em que te possa ser útil.

Abraços do

Jayme